quinta-feira, 21 de setembro de 2017

PERA LÁ! NÃO TENTEM TIRAR O POVO DO CAMINHO



Adianta muito o comandante do Exército, general Eduardo Vilas Boas afirmar que foi superado o episódio envolvendo as declarações do general Antonio Hamilton Mourão na Casa Maçônica Grande Oriente? Ou o atoleimado Raul Jungmann (ministro da Defesa?) declarar oficialmente que não há indisciplina no Exército?
Ou muito menos o general Mourão dizer que foi mal interpretado, suas declarações foram colocadas fora de contexto ou o episódio exagerado?
Até aí a discussão ficaria limitada a questionar se seriam bravatas de um militar irresponsável, se ele mentiu na palestra ou ao se considerar mal interpretado.
O que não faltou foi clareza ao falar para os seus amigos maçons.
“É óbvio que, quando nós olhamos com temor e com tristeza os fatos que estão nos cercando, a gente diz: ‘pô, por que não vamos derrubar esse troço todo?’ Na minha visão – e aí minha visão coincide com a dos companheiros do Alto Comando do Exército – nós estamos numa situação daquilo que poderíamos lembrar lá da tábua de logaritmo, de aproximações sucessivas, até chegar um momento em que ou as instituições solucionam o problema político pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos, ou então nós teremos que impor isso.” Ou seja, se falava em nome pessoal (e não podia ser diferente), dizia revelar o que seria um consenso do Alto Comando.
Seria o suficiente. Mas não ficou nisso. Afirmou que já um planejamento e lançou o que pode ser visto como uma ameaça ao Legislativo, ao Executivo (a quem o Exército deve subordinação) e ao Judiciário: “os Poderes terão que buscar a solução. Se não conseguirem, chegará a hora em que nós teremos de impor uma solução.”
Mas o retorno da síndrome autoritária ao menos de parte do oficialato superior já fora antecipado pelo general de Exército Maynard Marques de Santa Rosa em artigo (“é hora da reação”) publicado na página oficial do Exército no início deste mês.
Na sequência do que poderia no mínimo ser qualificado como um disparate do general Mourão, vieram as reafirmações.
O coronel Sérgio Paulo Muniz Costa, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, após uma menção indireta a Lula, diz que as palavras do General Mourão expressam uma unanimidade do Alto Comando”. Unanimidade é forte, né?
O general Paulo Chagas também reafirma as colocações de Mourão e deixa perceber a contradição que orienta a linha de raciocínio dos militares. Afirmando que o Exército “só agirá dentro da lei e com legitimidade”, mas se referindo a que, “na hipótese extrema de desordem total de perda do controle da situação pelas autoridades constituídas” – e faz referência a que “seria este o objetivo claro da esquerda bolivariana” – “os militares não poderiam ficar inertes, aguardando ordens” (e questiona “de quem?”), como se isso não estivesse perfeitamente delineado na tal LEGALIDADE, ou seja, a Constituição. Isto é, quando diz que “as FFAA, terão que tomar a iniciativa de restabelecer o controle da situação e, principalmente, a legalidade e a ordem”, essa iniciativa significa rasgar a Constituição, que não a autoriza, ao deixar claro que as Forças Armadas só se mobilizam na estrita subordinação ao presidente da República. Em outras palavras, fala em avançar do golpe institucional para o GOLPE MILITAR.
Não é diferente o teor da carta encaminhada pelo general de brigada Paulo Chagas ao senador Randolfe Rodrigues (Rede).
Mas o mais grave, observa a jornalista Mírian Leitão, na sua coluna em O Globo, é que o próprio general Vilas Boas, comandante do Exército, tentou desanuviar a tensão em entrevista em programa de Pedro Bial e, na verdade, reafirmou o que Mourão e os demais subordinados têm asseverado.
HÁ MUITO COM O QUE SE PREOCUPAR
De um lado, os militares referem-se enfaticamente à questão da corrupção e não deixam de evidenciar que isso se espalha pelo Executivo e pelo Legislativo. Não há novidade. Essa linha de argumentação, que aproxima uma eventual intervenção do atendimento a um clamor público, estava também na base do movimento militar de abril de 1964. De outro, pelo menos duas manifestações citam o que seria a “esquerda bolivariana” e indiretamente o ex-presidente Lula.
Pois é significativo que essas manifestações ocorrem em um momento particularmente rico do processo político brasileiro.
As forças políticas hegemônicas no Poder Legislativo e no Executivo desdenham da impopularidade do projeto que os fez afastar a presidenta eleita Dilma Rousseff e investem justamente contra os compromissos que ela levou à campanha de 2014, quando Michel Temer se travestia de seu companheiro de chapa.
Não se trata somente de que os entrevistados da recentíssima pesquisa CNT/MDA tenham atribuído uma avaliação positiva de mirrados 3,4% para o governo Temer. Ou de que o vejam com desesperança em todos os quesitos apurados: expectativa de melhora com relação ao emprego em magros 25,7%, à renda em 22,1%, à saúde em 21,1%, à educação em 25,0% e à segurança pública em 16,6%.
Mais eloquente é a posição de 80% contrários às reformas que são executadas pela coalização de Temer e a sua base própria com as forças que apoiaram a candidatura derrotada de Aécio Neves em 2015, à frente o PSDB. Ou seja, a verdadeira definição do golpe, uma união entre os derrotados eleitoralmente e o vice-presidente que traiu a presidenta eleita a afastou.
Em outras palavras, mesmo parte substancial dos que votaram em Aécio (a maioria deles) são hoje contrários ao programa que o fez candidato. Mesmo assim, é este programa que o Executivo e a nova maioria do Legislativo impõem ao País.
A ESCOLHA DO CAMINHO (QUE OS GOLPISTAS TEMEM)
Não é por acaso que o nome de Lula se mantém em franco crescimento como opção para presidente da República (32% a 32,7%) e o maior forte nome do PSDB (João Dória) esbarra em 9,4%, em quarto lugar, enquanto Aécio não passaria de 3,2%. Ou que cede progressivamente a sua rejeição, mesmo a pesquisa CNT/MDA tendo sido aplicada justamente nos três dias que se seguiram ao seu último depoimento ao juiz Moro. Embora alta, a rejeição ponderada de Lula é hoje a menor entre todos os nomes citados, com 50,8%. A maior é justamente a de Aécio (72,5%) e a mais próxima é a de Jair Bolsonaro, 52,2%.
Em cinco cenários de um hipotético segundo turno, Lula aplicaria goleadas em todos os eventuais adversários, com diferenças de 27% sobre Aécio, 17,3% com relação a Geraldo Alckmin, 16,4% para João Dória, 14% para Marina Silva e 12% diante de Bolsonaro.
Em outras palavras, isso indica que a sociedade começa a escolher o caminho para dar um fim à balbúrdia. Para enfrentar a corrupção? Não especificamente, mas o que mais lhe preocupa, a perda de direitos e de uma dinâmica na economia que garanta crescimento e empregos. É isso que a população vê em Lula, pois foi isso o que teve nos seus dois governos e boa parte do primeiro mandato de Dilma, mesmo que a crise econômica internacional tenha eclodido em 2008, metade do segundo mandato de Lula.
Há três principais grupos entre os virtuais eleitores de Lula.
Os que simplesmente reagem às acusações bombardeadas diariamente em jornais, rádio, TV e quantas outras mídias sejam controladas pelo capital monopolista. Fazem a leitura (ideológica) de que há uma tentativa para inviabilizar a sua candidatura judicialmente, com a sua condenação (por meio de processos que até hoje não têm provas) ou eleitoralmente, se não conseguirem a sua condenação em tempo. Avaliam que a guerra midiática tem em vista também tentar prejudicar a condição de Lula como o “grande eleitor”, aquele que, caso não concorra, terá condições de indicar o vencedor.
O segundo grupo é o dos que não acreditam nas acusações. De tão reiteradas pela grande mídia e sem que qualquer prova seja exibida, chegam à conclusão de que ocorre tão somente uma peleja, uma birra: de um lado, o juiz Moro e seu grupo; de outro, Lula. Ou entre os órgãos de grande imprensa e Lula. O que mais ajuda nessa compreensão é que, com a fartura e nitidez de provas contra outras personagens (Aécio, Cunha, Loures, Temer, Geddel, as esposas de Cabral e Cunha, entre outros), seus nomes saem rapidamente dos noticiários e não raro desaparecem também os sinais de que as investigações prosseguem.
O terceiro grupo é o que poderia estar preocupando quem tem posição de princípios contra a corrupção, entre eles os militares, embora na condição de cidadãos. Tal é o afã com que querem encontrar uma saída para a crise nacional que esse grupo sequer vê como grave uma possível culpa de Lula em processos de corrupção. Inclusive porque consideram as acusações desproporcionais com relação aos outros personagens implicados nos processos.
É o conhecido “rouba, mas faz”. Fui abordado por um simpatizante de Lula que me trouxe esse tipo de raciocínio quando busquei atendimento em uma casa de saúde de Brasília há poucos dias. Nem adiantou que eu tentasse questionar a culpa de Lula. O seu argumento era de que “isso não importa, ele é quem pode resolver a situação do País e trazer de novo emprego e crescimento”.
A gravidade disso é porque deseduca o eleitor. Transforma a corrupção como algo que é inerente à política e, se assim é, que se entregue o Brasil a quem pelo menos pode oferecer resultados à sociedade. Mas fica, na raiz, uma visão descomprometida com a realização de uma política sadia, voltada exclusivamente para os interesses da sociedade.
O POVO NÃO QUER ABRIR MÃO DA SAÍDA QUE VISLUMBRA
É verdade que – no desaparecimento do PSDB e na desqualificação também do PMDB, seguidos pelos partidos e políticos de prática política mais vinculada – cresce um eleitorado, ainda que minoritário, descomprometido com a democracia, mas fortemente avesso a Lula e ao PT ou mais genericamente à esquerda. É o grupo que vem nutrindo a candidatura radicalmente conservadora de Bolsonaro. Hoje, é o único nome que efetivamente cresce nas sondagens de opinião pública. Mas é notório que não escape da rejeição que contamina os políticos no seu conjunto e aparentemente ainda não tenha chegado ao limite do seu crescimento. Além do que dele não se aproxime boa parte dos eleitores conservadores.
Mas o fato é que Lula é o único a crescer diante do que talvez tenha sido a maior guerra midiática contra o nome de um político em toda a História do Brasil e não duvidem de que tenha sido o caso mais eloquente de linchamento pessoal do mundo.
É em face disso que preocupa o surgimento de uma onda que ameace com a intervenção militar, explorando claramente a insatisfação da sociedade com a questão da corrupção, mas sintomaticamente omissa com relação à questão social e econômica e, ao mencionar ou insinuar algum antagonismo político, demonstra que isso está na justamente na esquerda e em Lula.
É preciso estar atento ao conjunto do que revela a pesquisa CNT/MDA e, particularmente, uma novidade na apreciação do momento político da sociedade. Somente 5,03% declararam ter participado de manifestações pela saída de Dilma: 45,3% de 9% que estiveram em alguma manifestação desde 2013. Mas 30,8% têm intenção de participar de alguma manifestação pela saída do presidente Michel Temer.
Ninguém deixe de considerar a combinação desse indicador com o crescimento de Lula, a redução da sua rejeição e a avaliação programática do governo Temer, inclusive a condenação das reformas que são introduzidas por PMDB, PSDB e partidos coligados.
O povo sabe o que não quer, espera pela saída eleitoral e começa a identificar o caminho. Mas ninguém imagine que abre mão da esperança.
Fernando Tolentino

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